quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Tratar bem o ano que é novo

Vou tratar bem o ano que me oferece o virar do calendário. 
Ofereço-lhe sementes para colher pés de margaridas.
Para dar aos que navegam no mar comum, em busca de terra firme,
nas marés do riso, das lágrimas, nos silêncios, nas distâncias e sempre sempre no bolsinho do meu coração vivem.
Para cada ano desejo que a dança da alegria se torne a norma.
Feliz sementeira e colheita em 2016. As de 2015 já comi.


domingo, 13 de dezembro de 2015

"Benditas sois vós"

Uma crónica para as minhas mulheres. Aos homens fará certamente bem usarem-se dela.
"Benditas sois vós"
Vamos partir a loiça!
Hoje as mulheres sauditas vestidas de burka, proibidas de conduzir(logo conduzidas pelos maridos), votaram pela primeira vez em eleições municipais e até elegeram uma candidata.
Na religião, sexo e pecado caminham juntos com a vergonha de sentir desejo e o desejo de o saciar e, mesmo tendo Jesus dito "quem não tiver pecados que atire a primeira pedra" a nossa sociedade patriarcal continua a defender orgulhosamente os homens e a obrigar mulheres à rebelião.
Mas elas andam a partir a loiça!
As mulheres que se arriscam a papéis de relevo e poder têm de "ter os tomates no lugar". Onde vou com esta reflexão? Não sei, mas é sobre a escolha de ter uma vagina que quero escrever. Vaginas que partem a loiça.
Ainda bem que nasci mulher num mundo dominado por homens. O português que falo,escrevo e penso é machista, logo esse foi como mulher, o meu primeiro código a desmontar...Hoje adoro o equilíbrio da língua masculina carregada de poesia feminina.
Como qualquer ser humano todos temos um certo grau de ansiedade e depressão pelo somatório de experiências que vamos acumulando.
Ontem podíamos ser bipolares, hoje hiperactivas e amanhã instáveis, inconstantes e irresponsáveis ou ao contrário.
Eu mulher, fui uma criança, fui uma adolescente e sou uma adulta que alterna entre todos estes rótulos. Tanto andei à tareia com colegas de escola porque me chamavam preta da Guiné (ansiedade de verdade manifestada em hiperactividade), como me isolei e ficava horas e dias a fio a ler e a estudar (depressão), como socializava despudoradamente com os tropas na Guiné- Bissau em tempos de guerra colonial e desaparecia de mão dada com algum tropa, fazendo a família andar desesperada à minha procura (bipolaridade,feminilidade, e rebeldia). Tinha cinco anos.
Se o fizer hoje ninguém anda à minha procura. Isso de desaparecer de mão dada com alguém. É normal, sou mulher, preta da Guiné, adulta, posso dar a mão a quem quiser, desaparecer e fazer sexo com quem me apetecer. Mas ainda posso ser mal vista, não é um cenário descartável.
Deitei um dos mitos da religião abaixo e esta é uma das razões de dizer : ainda bem que nasci mulher num mundo dominado por homens.
Porque tive de corajosamente construir o meu caminho. E levantar-me como pó em terras de ventania.E preconceito.
Tornei-me uma mulher que quer como referência outras mulheres e que as mulheres sejam referências para as mulheres.
A referência principal da minha vida foi o meu avô por isso nada tenho contra homens. Ele foi tudo para mim e educou-me para ser uma mulher independente e livre.
Ensinou-me a ser a expressão da minha essência. O feminino.
Eu tive a obrigação de ensinar o meu filho homem a ter respeito e valorizar a mulher, nunca se julgando como ser superior como o é a cultura dominante. A ser sensível e emocionalmente inteligente. A estar na vida com amor. pelos outros sobretudo se forem mulheres. Ele está.
Ar, Água, Alimento, Abrigo, Agasalho são os cinco "A"´s essenciais ao ser humano (que aprendi com um sem abrigo por escolha), eu junto-lhe o sexto como forma de curar todas as patologias do mundo: Amor.
Somos porque os outros existem e nos espelham, nos dão amor, nos validam, nos respeitam, nos apreciam, nos vêem. E as mulheres têm tido tão pouco de tudo isto que se torna ainda hoje assustador. Por isso mais amor é preciso.
E, sabemos intuitivamente que o mundo seria mais equilibrado se homens e mulheres se conduzissem mutuamente com respeito, amor e sem burkas que vedem o olhar sobre cada um.
Aliás o mundo já existiu debaixo do matriarcado (assunto para outra crónica).
Conheço muitas mulheres e por elas faço esta reflexão. Eu sou todas elas (como diz a canção) e eu como as que conheço e não conheço, as minhas antepassadas, as delas e as que virão, tive de lutar contra os homens que não me deram amor, não me viram, não me validaram, não me respeitaram, não me deram o devido valor, numa circunstância ou noutra.
Levei lutas para casa, trouxe lutas para fora de casa, como essas mulheres e como as que ainda vão ter de lutar.
A luta é por um reconhecimento no posto de trabalho, pelo trabalho árduo como mães, pelo esforço de não continuar numa relação tóxica ou violenta, pela desistência em situações de chantagem emocional ou sexual, quando sofremos na pele o desafecto da família, quando a família se desliga porque não correspondemos às suas expectativas, quando nos encolhemos e nada falamos, ao toque inapropriado de um tio, de um irmão, de um pai, ou qualquer agressão sexual, física e outros innuendos, de estranhos, colegas ou amigos.
Ser mulher ainda hoje é conviver com todas estas formas de violência em todos os cenários imagináveis, ou impensáveis, diariamente.
É verdade sim, com as mulheres pretas o cenário piora em todas as circunstâncias. Basta olhar e ver à nossa volta.
Não vale a pena fazer barulho sobre o assunto ? Talvez o erro da mulher tenha sido o de deixar passar a carroça sem fazer barulho. Castrada pela religião que a carrega de vergonha. Vergonha do pecado, do sexo ou de ser a sua essência.
Somos todos diferentes com pouco ou muito barulho. Esta é uma realidade. E até hoje continuamos a aceitar que nos digam que não devemos ser diferentes desses homens e mulheres que têm na religião e na intolerância o seu dogma. Que devemos ser submissas e obedientes.
A realidade da maioria das mulheres (posso dizer todas, porque todas já vivemos uma ou outra destas experiências), todas elas transpirando feminilidade, insubmissão e desobediência ainda é ter de bater o pé, dizer não mais do que uma vez, atirar um estalo, gritar com a mãe que não vai fazer algo que lhe "destinou" o seu papel de mulher, fazer uma queixa na polícia por violência e/ou violação, fechar os olhos ao apalpão do patrão ou do tio...e por aí fora. E sim, tudo isto é errado e não nos devia acontecer.
Nenhuma mulher vive confortavelmente nestes sapatos de luta constante. Felizmente muita coisa está a mudar. Lentamente,muito lentamente. As mulheres ainda têm muita estrada para calcorrear porque ainda têm nos homens as suas referências e, entraram no caminho da competição. Querem ser iguais a eles. E este não é nem nunca foi o meu caminho. Nem o é o das mulheres.
O poder da mulher é justamente o de ser diferente. Eduquemos, ensinemos, formemos as nossas filhas para não terem vergonha. Ensinemos,formemos, eduquemos os nossos filhos a integrar a beleza do feminino e a respeitarem-no.
Padeço de algumas patologias que não me foram diagnosticadas por médicos, por causa das minhas lutas como mulher:
-uns dias ansiedade e noutros depressão, uns dias bipolaridade, outros hiperactividade entre outras disfuncionalidades.
Não se tornaram graves porque sempre tive mulheres e homens que me ouviram, protegeram, elevaram a minha auto-estima e deram amor.
Tornei-me uma lutadora voluntária contra a vergonha sexual, a religião castradora e a falta de oportunidades sabotadas às mulheres.
Urjo as mulheres a ensinarem os filhos a amar as mulheres para além do seu papel tradicional oferecido em dois mil e quinze anos por homens que nada sabem de mulheres.
Jesus, que eu saiba nunca as tratou como os que assumiram o controlo do Cristianismo e ainda disse- " quem não tiver pecados que atire a primeira pedra".
Ainda bem que nasci mulher e preta, num mundo dominado por homens e brancos.
Ao passar por todas as experiências desta viagem, encontrei o caminho para a minha essência. Aprendi a ouvir a minha intuição. Tornei-me bambu. Oscilo mas os tomates femininos da vontade e a determinação fazem-me voltar à forma original.
Por isso, sem o espírito da época que nada me diz, praticante de Amor diário, lembrem-se todas as Marias da terra:
-Não precisamos que nos dêem nada, só precisamos que não nos tirem as oportunidades de manifestar a nossa essência.
Nós escolhemos ter os tomates femininos.
E partir a loiça!

sábado, 12 de dezembro de 2015

"Democracídio"

Hoje ouvindo a história (brilhante diga-se) de um sem abrigo por escolha, brasileiro, de nome Eduardo Marinho, cansado do que a sociedade lhe oferecia, decidiu ir viver para a rua e aprender com os "underdogs" (excluídos, explorados, insatisfeitos) e com os pobres que sustentam a vida dos ricos (a da sua própria familia).
Como ele diz, com eles aprendeu a observar, absorver e reflectir e criou o seu próprio blog. Lá faz a sua arte. Sem se vender ou competir, porque fazer isso não é vida.
Continuo a pensar, chegámos ao século vinte e um, era dos telefones espertos mas de gente broncae (os que se submetem e aceitam estas regras) e ainda temos de estar a discutir direitos do século dezanove que deveriam ser hoje o oxigénio de todos...impensável!
Inspirou-me a escrever este poema que se eu soubesse musicar seria uma canção. Obrigada por me lerem. smile emoticon
"Democracídio"
Humanidade digna desse nome não tem abandonados
miseráveis, sem tecto, explorados, refugiados
ou da vida sabotados
Os dinheiros públicos, são isso mesmo, públicos,
de todos vêm,
entregues nos impostos, nos descontos dos ordenados
dinheiro limpo e honesto
de gente limpa e honesta
imprescindível para satisfazer as necessidades
de todos os humanos
de Ar, Abrigo, Alimento, Agasalho, Água
porque todas as outras são supérfluas
Esse dinheiro limpo e público
deveria estar ao serviço de quem vive nas franjas
dos que não têm privilégios,
mas têm consciência
que são parte da humanidade e acordam a gritar:
-"vou passar por aqui e vou sair
sem ter vergonha da minha vida"
Enquanto um grupo de gente, esses sim miseráveis,
que vive em ilhas,
vencidas com medo dos excluídos
vendidas ao dinheiro
protegidas por privilégios
neste "democracídio" que usa o poder, para roubar e matar
e usa o roubo e a morte, para continuar impunemente no poder
grita ordens para que a forma vença o conteúdo
e no mundo do poder continuarem a adentrar
Ah infelizes democracídas
eu sou como eles,
os desalinhados,
como o creme de maionese que talha
estou com os fora da caixa, que pintam fora dos riscos
eu sou como eles,
os que estão fodidos e enganados
eu faço a minha revolução
não vendendo a minha consciência
não largando a minha docilidade
não me deixando submeter
nem me calar
usando a arte não para ganhar
ou competir,
mas para vos foder
para pensar na evolução
porque a vida, essa,
vai entrar, passar por mim e sair
e eu dela nunca me vou aborrecer,
nem dela nunca me vou envergonhar.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Rendimento Básico Incondicional ?!

Imagine-se Portugal ( e mais ou menos 200 países) sem caridade, sem assistência social (subsídios, abonos), sem Misericórdias ou IPSS´s, sem Banco Alimentar contra a Fome, sem RSI, sem Cáritas? Independentemente de ser pobre ou rico ? Onde toda a Segurança Social usa um simplex para a satisfação de necessidades básicas?
Resumindo, todos terem as necessidades básicas satisfeitas e poderem escolher o que fazer com a vida desde que nascem, em vez de herdarem dívidas impagáveis, trabalho mal pago, precário e situações que levam ao desespero, à insatisfação e infelicidade?!
Já pensaram que a liberdade é a essência do ser humano? Afinal a massa de que somos feitos.
O modelo de trabalho introduzido com a Revolução Industrial está obsoleto. Por várias razões e uma delas prende-se com a evolução da tecnologia.
Por razões de sobrevivência no planeta, o consumo ilimitado dos recursos e a obsolescência programada, o espalhar a miséria e a austeridade são sistemas de vida obsoletos.
Já vi, já senti, já vivi, já entendi. Já sei que não serve.
Então, não será tempo de pensar como os finlandeses e holandeses estão a pensar fazer?
É que continuar a cooperar com esta Europa, nos moldes em que se encontra, é uma forma obsoleta de prosseguir. Desta actual má equação não sai resultado matematicamente correcto. É uma experiência com garantias de resultados desastrosos.
E as direitas espreitam quais raposas esfomeadas...
Interessa-lhes ter as galinhas com fome, desesperadas, estúpidas, fáceis de apanhar e sem buracos para saírem do galinheiro...
Trabalhar 8/9/10/12 horas para ganhar pouco ou muito? Para quê? Em quê? O mundo não continua a girar se trabalharmos menos e dedicarmos mais vida à vida? Ou será a produção e a exploração a única solução? 
Ou as escolhas de cada um não têm direito a ser considerados? E dar a cada ser humano a possibilidade de apenas ter de pensar em ter uma vida digna? Isso pode ser uma equação onde inclui o Rendimento Básico Incondicional.
Eu não tenho pretensões a fazer mais do que ler poesia e apreciar o mundo, não a mudar o mundo... os deuses que me livrem dessa tarefa, dá uma imensa trabalheira mas que gostaria de ver mais estrelas no lugar de poeira e lama, isso gostaria.
Diria a criada malcriada: - Então e agora a minha senhora o que vai fazer?
-fazer? vou beber um gin e descansar desta maçada toda. Pensar dá uma trabalheira imensa, sei lá...

sábado, 5 de dezembro de 2015

5 de Dezembro- Dia Internacional do Voluntário

Voluntário :Aquele que exerce uma actividade voluntária e não remunerada em qualquer entidade pública ou instituição sem fins lucrativos que tenha objectivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social.
Quando a vida pede mais alma, ou quando a alma quer viver uma vida autêntica.
Hoje celebra-se o dia Internacional do Voluntário. Quase precisamos de mais um calendário para celebrar dias especiais.
Mas este é para mim muito especial. Vou escrever sobre uma das minhas experiências.
Em 2001 fui a escolhida num concurso internacional para ser a Promotora/Coordenadora do Ano Internacional do Voluntário (escolhido pelas Nações Unidas) em Moçambique.
Ser Voluntária das Nações Unidas, o "braço forte no terreno" como nos chamou Koffi Annan, o nosso representante à data de 2001, foi das experiências mais inspiradoras que tive. Que me levou a ser melhor, a dar o que sou de melhor, a implicar a alma no trabalho. Tornei-me um ser humano mais próximo dos outros, importante para a vida dos outros e tudo o que fiz e partilhei foi com o objectivo de ter impacto real na vida das pessoas.
Ao bombardearmos a vida das pessoas que precisam, com oportunidades reais para o seu desenvolvimento e sustentabilidade abrimos novos caminhos para o seu verdadeiro crescimento.
Esta é para mim a definição de voluntário.
São muitas as histórias, pessoas e experiências que partilhei e guardo eternamente. Porque vão viver para sempre em mim e no ser em quem me transformei depois de ter sido voluntária. Agradeço a todos e à vida por me ter dado a oportunidade de dar largas à minha alma.
Das muitas actividades e pessoas com quem trabalhei não me posso esquecer do projecto- lei que uma larga equipa elaborou e pessoalmente entreguei na Assembleia da República de Moçambique para protecção do trabalho Voluntário inexistente até à data.
Viria a ser aprovado em 2008 o que me encheu de orgulho e vaidade.
Das acções de formação de activistas para o HIV-Sida, às inúmeras feiras de angariação de fundos, aos leilões de quadros generosamente doados (Naguib por exemplo) por artistas Moçambicanos para atribuição de bolsas de estudos a jovens voluntários.
Nessa noite eu ia ficando muito pobre já que o meu filho que me acompanhava em todas as acções dos voluntários, licitou em €1,500 USD um dos quadros do Naguib, simplesmente porque o adorou. Felizmente a Visabeira licitou mais alto e ganhou o quadro, ou eu teria deixado de comer por um ano.
A construção de uma escola e um centro de saúde numa aldeia remota do centro do país onde se chegava apenas de tractor, com o trabalho incansável por duas semanas de várias organizações de Voluntários foi dos maiores marcos do ano.
A imensa tela pincelada por todos os participantes na Meia-Maratona contra a Pobreza patrocinada pelo PNUD e pintada voluntariamente pelo mestre Malangatana foi mais um degrau do AIV 2001.
A tela, de valor incalculável, oferecida à Cruz Vermelha de Moçambique(a maior organização de Voluntários comandada pela enorme e querida amiga Drª Fernanda Teixeira), com cinco metros de comprimento por dois de altura, transportei-a debaixo do braço até Genebra para a conferência dos UNV´s onde iria representar o país.
Expus a tela e o nosso Patrono (do Ano Internacional do Voluntário) ao vê-la, convidou-me para ser recebida por ele e falar sobre as actividades do ano em curso em Moçambique. Não era um convite, era uma ordem que vinha de sua Alteza Real o Príncipe Filipe das Astúrias, hoje Rei de Espanha. Por ele fui recebida, ouvida e Moçambique e os seus voluntários ficaram assim orgulhosamente conhecidos.
A grande celebração aconteceu no dia 5 de Dezembro de 2001, com um espectáculo de várias horas com todos os artistas moçambicanos que voluntariamente cantaram e tocaram na celebração do Ano comigo na apresentação qual Julio Isidro no "Natal dos hospitais". Sem doentes porque até ministros dançaram (o que não é difícil conseguir em África).
Ser voluntário é dar largura, comprimento e estender uma tela de estrelas que são os voluntários quase sempre pouco reconhecidos, e às suas almas, que nela se comprometem em fazer o que deve ser feito. Estar próxima de quem precisa e ter impacto na vida das pessoas.
Por isso somos "o braço forte no terreno". E necessário.
Obrigada voluntários.
Vivam os voluntários.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Espírito de Dezembro...

E este espírito que consome Dezembro enquanto a guerra que avança e transforma a Humanidade em neve de Janeiro...?
De que me serve saber fechar os olhos a beijar se não os souber fechar para sonhar? De que me serve viver sem ter a mesma altura dos sonhos que me visitaram o sono?
De que me serve meditar se não souber estar na minha companhia, em silêncio para me ouvir? De que me serve reciclar se não souber parar de consumir? De que me serve ter cultura e saber falar se não souber ouvir o outro e não me sentar nos seus sapatos para o entender? De que me serve ser inteligente se me rodear de violência e manipulação? De que me serve pedir paz, se ofereço e partilho raiva, sangue e preconceitos? De que me serve pedir transparência se for apenas opacidade e me esconder atrás de truques de ilusionista? De que me serve pensar em coerência, se as minhas acções não reflectirem o que sinto e como penso?
De que me serve o espírito de natal se não tiver um livro com estrelas, que me receba num refúgio, num coração, longe da falsidade e da falta de empatia?
De que me servem os olhos se não sei ver para além de mim próprio? De que me serve a capacidade de ouvir se nunca paro para escutar?
Experimentemos este momento- de frio e guerras no hemisfério Norte, de fome e escravatura no hemisfério sul, porque somos um com o mundo- e vestirmos todas as saias do mundo, calçarmos todos os sapatos do mundo e conhecermos quem é cada um, vestindo e calçando as suas vestes e sapatos, sem exclusões nem que seja dos que estão ao nosso lado?
Dancemos juntos uma coreografia de roupas e sapatos autênticos. Nem que seja enquanto um boneco de neve se derrete numa brincadeira de Dezembro no hemisfério Norte, ou um pilão faz farinha de milho para o jantar de uma família em Janeiro no hemisfério Sul.
A OMS informa que faz mal à saúde massacrar com a tradição do Natal dos bonzinhos vestidos de seda em Dezembro e palha d´aço em Janeiro (serve para a política e qualquer outro relacionamento entre humanos).

Se eu fosse miss diria que gostaria de ter a paz no mundo mas como já não acredito no Pai Natal nem em misses, o melhor presente pode ser mesmo mais tolerância. Caso falhe, ofereçam outra vez meias de lã...


quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A Rosa Parks

Dedicado a Rosa Parks. A todas as Rosas que se sentam no lugar certo. E lutam pelo lugar delas! O seu legado ficou para mim e todas as mulheres sem distinção de cor, que hoje têm direitos e oportunidades quase iguais. Obrigada.
Deitou-se faz hoje uma vida,vestindo um pijama de estrelas derramadas,cobriu-se de sonhos. Neles se celebrou. Nas cinzas da lama das vaidades superficiais a alma lavou. A voz deixou de ecoar no vazio dos tempos. Esperou a lua, cor de sal para se vestir igual à sua beleza.
Espreitou-a e pintou-a com a constelação da liberdade no colo e murmurou-lhe: és em cada dia de todos os tempos mais e mais quem podes ser e és. Vives do coração e é na solidão que encontras emoção. Segue em paz.
Pudesse ela escrever com sabedoria e a ela escreveria versos sábios. Soubesse ela cantar e cantaria hinos à sua alegria. Conhecesse ela música e comporia sonatas. Soubesse ela tornar-se poesia e escreveria cantando beijos para os seus lábios. Pudessem os seus pés subir ao céu, subiria sem arnês nem protecção. Mas sabe sonhar e vai continuar a fazê-lo.
Quem és tu? Uma cigana que lê folhas de Outono caídas nos jardins onde lhe encanta voar, e descobres os segredos do seu coração?
Acordou ao fim de um sono de uma vida.
Quem és tu feiticeira que assim me descobres,quis saber ainda estremunhada e aquecida?
Descalça dançou até à janela.
O sol cumprimentou-a com uma piscadela doce. Sabia que vinha de um encontro com o seu amor infinito. Com cuidado despiu-lhe o pijama de estrelas, banhou-lhe de sorrisos, vestiu-lhe de raios simples, calçou-a de ternura e sorrisos, colocou-lhe um lenço perfumado na cabeça para a proteger da condição terrena e cantou-lhe: vai, leva uma brisa de infinito para no teu pomar semeares mais sonhos em poesia.
Nesse dia lutou.
Abriu as asas e viveu.